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Viver com a certeza do fim


A morte é um assunto delicado para a maioria de nós. Não fomos estimulados a pensar a respeito dela. Começamos a pensar que é um destino inevitável e dá medo, logo evitamos o assunto. A maioria de nós não sabe quando vai ser, como vai ser e o que vai ser (se é que vai ser alguma coisa) quando não estivermos mais aqui. No entanto, é só por causa dela que temos essa pressa de viver, de experimentar, de fazer valer a nossa existência.

Estou lendo “A morte é um dia que vale a pena viver” da escritora Ana Claudia Quintana Arantes e tenho me aproximado de novo do tema: ela fala da experiência dela como médica Geriatra e estudiosa de Cuidados Paliativos.

Percebi como esse tema é subversivo e o tamanho do tabu em torno dele quando quis dar esse livro de presente de aniversário e em seguida me reprimi: “o que essa pessoa vai pensar? Que eu quero que ela morra?” Talvez na primeira impressão, pensasse mesmo, mas a verdade, é justamente o contrário. Coabitar com a possibilidade da morte faz a gente aproveitar mais, ver cada encontro com um olhar de momento especial, ver a vida como rara a cada instante.

Com os avanços da medicina é cada vez mais frequente o número de pessoas que sabem quando sua morte está próxima e ainda mais frequente o número de pessoas que sabe de que a morte dos seus familiares está próxima. Não estou vivenciando essa dor agora, mas sei de pelo menos três pessoas que estão com familiares com esse prognóstico, por isso me deu vontade de escrever.

Hoje considero um privilégio essa informação, mas nem sempre foi assim. Na minha adolescência, não fui comunicada sobre um diagnóstico irreversível de um familiar. Ele tinha apenas alguns meses de vida e não aproveitei esses momentos como gostaria. Fui vivendo essa nossa fantasia coletiva de “eternidade”... Se tivessem me dito essa dura verdade, com certeza eu teria vivido uma enorme tristeza, mas também poderia ter experienciado mais proximidade, perdões e agradecimentos mil. Não foi legal ser poupada disso, até porque a dor chegou do mesmo jeito.

O que fazer caso essa situação aconteça? Depois da minha experiência e de ler esse livro, penso que o que pode ser feito com a fatalidade da morte à vista é o que é possível. Tanta coisa e nada ao mesmo tempo, porque o que é realmente importante surge nessa hora nítido como nunca antes havia sido. Duas coisas ficam claras pra mim que escrevo pra ti que talvez passe por isso: a morte traz a luz a necessidade da nossa presença no agora e também um respeito máximo à vida.

“Qual a coisa mais assombrosa do mundo Yudhisthira? E Yudhisthira respondeu, “A coisa mais assombrosa do mundo é que, ao redor de nós, as pessoas podem estar morrendo e não percebemos que isso pode acontecer conosco.” Mahabharata


Juliana Wesendonk Soeiro


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