"Aqui é lindo, filha! Um dia nós vamos vir pra cá juntas, vou te mostrar a Lapa, o calçadão de Copacabana... Vamos num ensaio da nossa verde e rosa. E, quando eu me aposentar, vou morar aqui e esperar vocês nas férias com os meus lobinhos". Foi assim que mamãe me descreveu o Rio de Janeiro quando foi pra lá pela primeira vez. Naquele telefonema eu pude sentir a alegria na sua voz, a animação de estar num lugar tão desejado por ela. Nos anos seguintes ela foi pro seu amado RJ mais algumas vezes. Todas as vezes eu não pude ir, mas pude sentir como se estivesse lá, junto dela, em cada lugar. Nos seus últimos dias de vida, enquanto admirávamos os fogos de artifício que anunciavam um novo ano, fizemos um pacto: Depois de tudo o que se anunciava para nós, depois da tempestade, depois do medo, nós finalmente iríamos juntas pro RJ. Infelizmente esse dia não chegou, mas o pacto que fizemos naquele dia ecoou em mim, me fazendo prometer que iria conhecer o seu RJ do jeito que ela queria.
Sobre o seu RJ... O Rio de Janeiro que eu vi era tão alegre e barulhento como mamãe. As pessoas eram tão boêmias e convidativas como ela foi. As ruas de Copacabana eram exatamente como eu imaginava... Repletas de cores, histórias, amores e vida. O calçadão de Copacabana era do jeito que mamãe descrevia: Intenso, alegre, risonho e cheio de gente, de festa, de música. A Lapa, tão amada por mamãe, foi tudo aquilo que ela me disse... Gritava comigo dizendo que ali nossos ancestrais fizeram morada... Os arcos, ah os arcos da Lapa!! Eles fizeram meu coração pulsar, meu olhos inundaram de emoção porque eu pude entender o que despertou esse amor pelo RJ nela. Eu senti a magia das nossas crenças em cada ruela, em cada pessoa, em cada esquina. Ipanema, sua tão amada Ipanema... Ela é linda, amarela, solar, diversa... É uma Bossa atrás da outra, um idioma diferente a cada posto, um caldeirão de etnias. Eu pude ouvir seu riso em cada metro de areia que eu cruzava. Quando cheguei aos pés do Cristo eu só pude chorar e te dizer: Nós conseguimos, mãe! Estamos aqui juntas! Mesmo com medo daquela altura toda, eu pude ouvir suas palavras, sua oração pro Redentor... Cada prece sua me fez sentir mais forte e grata por estar aqui... Por chegar até aqui.
- Eu renasci! Na pedra do Arpoador eu senti as bênçãos de iemanjá, que me banhou com aquele azul sem fim... Também senti as bênçãos de nossa Osun, que me beijou com o sol e soprou em meus ouvidos o quanto você estava feliz. Ali, sentada diante daquela imensidão, eu fui tomada pelo mesmo amor que a encantou. Senti a alegria de estar no Rio, senti a energia de cada lugar, ouvi suas risadas altas e escandalosas, suas piadas picantes que me deixavam sem graça, seus beijos estalados e eufóricos que comemoravam o fato de estarmos no nosso Rio, que agora também é meu - ou nosso -. Mamãe, que alegria a minha seguir o roteiro que você me deixou e desbravar o seu amado RJ pelos seus olhos. O seu Rio de Janeiro continua lindo e me lembrou você em cada esquina, em cada barzinho, em cada roda de samba.. Eu te vi e ouvi em tudo.
Eu tenho certeza de que nós estávamos juntas! Até a próxima, irmãs!
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