" O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem"
Guimarães Rosa
Naquele final de tarde, chorando, com medo, frustrada, só lembro da pressa que eu tinha em pegar a minha amiga bicicleta, parceira de tantos pensamentos, e fugir.
Eu pedalei tão forte e tão rápido, que não percebi quão debilitada eu estava.
Eu, sempre tão centrada, tão forte, tão capaz, não tinha percebido o quanto estava machucada, o quanto os últimos anos me deterioraram. Eu fui me apequenando para caber em espaços que na verdade eu nem deveria estar.
Fui me diminuindo, me esvaziando e me perdendo de mim mesma.
Eu queria ser aceita, mas eu nunca fui.
Eu queria ser do time, mas nunca fui.
Eu queria ser "normal", mas eu sempre soube que nunca fui.
Eu queria seguir o rebanho, mas eu sempre fui a ovelha negra da família!!
Minha mãe me dizia que algumas pessoas nascem com um sol dentro de si... Ninguém pode apagar o sol, porque eu achei que sim?!
E ali, naquele momento de choque e de ruptura, eu entendi que eu apaguei o sol que nasceu comigo e fugi de uma natureza que é minha, que nasceu comigo e que me define.
Correndo do lugar que me diminuiu eu cai num canto, de frente pro sol e pra água doce que são minhas moradas e desabei. Chorei sete anos de uma represa enfurecida pra transbordar.
Tenho certeza de que as pessoas à minha volta me olhavam e pensavam " O que será que está acontecendo"?
Eu precisava me curar e drenar o veneno que me paralisou, que me fez duvidar de mim e esquecer quem eu sou.
Eu sou filha do sol, do mel, do amor. Sou feita dos ventos fortes de Oyá, do mel doce de Osun, da força livre e genuína das mulheres que são minhas ancestrais.
Eu sei, também, que foram elas que me ouviram em cada prece, em cada lágrima que derramei no banho, em cada pensamento meu pedindo socorro.
Eu sou o sonho mais ousado das minhas ancestrais.
(...)
"Seja você seu próprio recomeço"
Essa frase linda surgiu assim, na minha frente, num desses adesivos de carro e foi nesse momento que eu percebi que sim, eu preciso ser meu próprio recomeço. Eu preciso entender que eu sou a pessoa no controle da minha vida e que as pessoas só irão fazer comigo aquilo que eu permitir que façam.
Foi preciso uma porrada daquelas fortes, que te colocam para dormir - e chorar por dias - para eu entender que eu sou grande demais para caber em espaços minúsculos, que eu não posso ficar no lugar de mártir para sempre e que sim, eu preciso agarrar as rédeas da minha vida como quem agarra um touro pelos chifres.
Eu entendi que eu já me reconstruí muitas e muitas vezes e que provavelmente ainda irei passar por outras reconstruções.
Eu perdi tudo e renasci, sobrevivi e estou aqui.
Apesar de tudo, estou aqui!
Sabe aquele sol que mamãe dizia ter nascido comigo? Ele voltou a brilhar forte, amarelo e incandescente. Ele está me aquecendo por dentro como nunca, me fazendo lembrar que ninguém tem o poder de apagar o meu sol.
O que a vida quer de nós é CORAGEM!
O que a vida quer de nós é CORAGEM!
O que a vida quer de nós é CORAGEM!
É o que eu tenho dito a mim mesma todos os dias!
Até a próxima, irmãs!
Por Amanda Alves Rodrigues
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