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Sobre a importância de cada Ciclo!



“Como eu tenho vocação para ser feliz, vivo as felicidades possíveis. Mas, antes, eu tinha a plenitude disso.” (Glória Perez – Série Pacto Brutal: O assassinato de Daniella Perez)

Assistindo a esse crime brutal e que parou o país, o que mais me chamou atenção não foi o horror e a barbárie do assassinato da jovem atriz Daniella Perez – embora eu tenha virado o rosto em alguns momentos da série -. O que mais me chamou atenção foi a força da autora Glória Perez e a importância de encerrar aquele ciclo.

Explico: Eu vi uma força familiar, um olhar com lágrimas empossadas há 30 anos, mas que não podiam cair. Vi uma mãe que perdeu a cor dos seus dias numa fração de segundos, mas que precisou ser corajosa, apesar de destruída, para poder honrar o nome de sua filha. Vi uma mulher que, após 30 anos desse triste episódio, pôde finalmente encontrar um fim para esse ciclo.

Horas depois de assistir aos primeiros episódios dessa série, fiquei refletindo sobre várias declarações da Glória Perez e me vi ali, num encontro comigo no agora e com a pessoa que eu fui há 3 anos... Eu fui reportada para aquela madrugada do dia 13 de janeiro de 2019, para as 02h01 daquela manhã chuvosa, para o instante fatídico em que o meu telefone tocou... Para o medo que senti ao ver o nome do hospital no visor do meu celular.

Eu revivi o momento em que eu entendi que nunca mais seria a mesma pessoa... Que os dias não seriam os mesmos, que as pequenas banalidades dos dias seriam absurdamente cinzas e silenciosas.

Eu pensei nas coisas que aconteceram nos últimos anos e que eu não pude ligar e contar pra mamãe... Pensei em todo o futuro que se apresenta pra mim, mas que será meu e não nosso! Pensei no filho/filha que eu desejo ter, mas que não será abraçado por ela. Penso no medo que eu sinto todos os dias, mas que não posso contar. Penso nas viradas da minha vida, na ansiedade, na felicidade, nas lágrimas, nos risos que nunca mais ela verá.

Penso nessa sensação que eu tenho de que a sua ausência fica cada vez mais “aceitável” e que estamos mais próximas do fim desse nosso ciclo. Penso no medo que eu sinto de quem eu vou ser na próxima década sem ela por aqui... Será que ela aprovaria? Estaria orgulhosa de mim?

A iminência do fim desse ciclo me sopra os ouvidos como um lembrete de que estamos em paz, de que as felicidades triviais e cotidianas precisam ser apreciadas por mim – e talvez por ela também -.

O sabor desse desfecho é agridoce nos meus lábios... É como passar por um portal em que eu preciso me despedir da filha/mulher que eu fui na primeira parte da minha vida, mas cumprimentar a mulher que estou me tornando. Mamãe amou e conhecia cada fragmento daquela que eu fui... Agora, na beira desse portal, eu suplico para que ela siga amando e descobrindo essa nova versão de mim. Talvez possamos nos conhecer ao mesmo tempo?!

A despedida desse ciclo é como dizer adeus a tudo o que fomos lá atrás, quando o cheiro de incenso e defumação era o desenho do nosso lar... É como planejar as linhas dos próximos capítulos sozinha, sem o seu olhar vigilante sobre mim.

É como renascer do escuro, do medo e do luto... É como conseguir imaginar uma vida feliz... Mais do que isso, uma vida feliz e sem ela!

É “viver as felicidades possíveis”, mesmo com aquelas lágrimas eternamente represadas nos meus olhos.

Sentir a proximidade do fim desse meu ciclo é como me despedir dela por um tempo determinado, sabendo que mais pra frente um novo ciclo de nós duas irá recomeçar... É saber que terei pequenas doses dela no meu amor materno, na minha vigilância que será constante, no meu medo de ser firme demais ou mole demais, nas frases de efeito que eu vou roubar, nos rituais que eram dela e agora são meus, nas preces que eram suas, mas agora são minhas.... O fim desse ciclo é como voltar pro seu ventre e nascer de novo... Mais forte, mais frágil, mais livre, mais corajosa, mais sábia, mais atrevida, mais doce, mais ácida... É como carregar aqueles seus fragmentos - que eu te prometi na nossa primeira despedida - sabendo que tudo o que nascer de mim será um pouco você!

O fim desse ciclo é o começo de um novo ciclo pra nós duas... Você como minha mentora e eu como sua continuação. É seguir rumo ao desconhecido encharcado de você, mas em busca de mim!

A vista daqui é linda e solar, como você era pra mim... Eu sei que as pequenas doses de felicidade somadas ano após ano um dia serão gigantes. Um dia a plenitude das minhas pequenas doses de felicidade não será mais clandestina, apenas vivida.

Até a próxima, mamãe!

Por Amanda Alves Rodrigues

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