top of page

Pequena Revolução


O capítulo 7 do livro Mulheres que Correm com lobos nos fala de um tema que não deveria, mas é um dos problemas mais comuns enfrentados no dia a dia das mulheres: a aceitação do próprio corpo. Tem tanta coisa que já foi dita sobre esse assunto que temo me fazer repetitiva.

Sinto que é hipócrita escrever qualquer coisa sobre aceitação do corpo sem admitir que não tenho uma relação total de amor com o meu. É dia a dia.


Somos invadidas por essa sensação de que se não “cuidarmos dele” como devemos, alguém vai nos desmerecer. As unhas pintadas, as mãos e cotovelos hidratados, o rosto maquiado, os braços finos, a barriga chapada, os peitos no queixo, as pernas sem celulite, os pés “(per)feitos”, o corpo depilado, a bunda empinada, o nariz fino e arrebitado, sem rugas.


São tantas as exigências que poderia seguir escrevendo eternamente. Ouso dizer que não tem nenhuma mulher no mundo que não tenha sentido raiva do próprio corpo ou de alguma parte dele. Uma raiva de si mesma, um ódio a própria existência, aos próprios genes.

Isso faz a gente esquecer que tem esse corpo porque veio de determinada família, de determinada região e que esse corpo é assim porque fomos passando por várias experiências que foram modificando seu formato, suas cores, seu peso, seu aspecto. Dito isso, quero fazer uma carta de agradecimento e perdão pro meu próprio corpo, que pode servir pro teu também.


Querido corpo,

Temporário e mutante, que expressa minhas angustias, minhas dores, meus desejos. Hoje já adulto guarda memórias de todas as minhas experiências. A cada dia que passa com menos colágeno, mas também com mais maturidade. Respeito tuas curvas, tuas articulações, tuas rugas. Me perdoe por muitas vezes me esquecer das tuas necessidades, da tua história e da tua missão no mundo.


Obrigada pela sabedoria: Quando me conecto contigo sei exatamente pra onde devo ir e o que fazer. Quando me perco de ti, esqueço quem sou, me comparo com outros corpos, atendo outras demandas e outras exigências.


Obrigada por expressar as minhas mudanças; obrigada por me avisar quando fico muito estagnada, ou quando estou muito ativa. Obrigada por adoecer quando bate um desequilíbrio forte e avisar que preciso me reestabelecer.


Obrigada por te rebelares quando não expresso minhas emoções. Por expressar beleza quando estou no lugar certo e na hora certa, e por expressar feiura quando o ambiente não me favorece.

Por se encolher e me proteger quando me sinto humilhada ou invadida. Por me dar a oportunidade de sentir todos os prazeres da vida. Por expressar as características dos meus familiares. Por me levar por todos os lugares bonitos que já vi.


Obrigada por me conectar com as pessoas em vários níveis, por me permitir a vulnerabilidade e a sensibilidade. Pela força quando é preciso. Por sinalizar o perigo. Por ouvir os sons. Por ser diferente e demonstrar algo mesmo sem dizer nada. Obrigada pela possibilidade de dançar.

Sei que só existo contigo e que tu não serve para ser instrumentalizado, objetificado ou marginalizado. Só merece respeito, principalmente de mim, mas também de todo mundo, pois somos o mesmo ser.


Se amar é uma pequena revolução. Por Clarissa: “Uma mulher não pode tornar a cultura mais consciente apenas com a ordem de que se transforme. Ela pode no entanto, mudar sua própria atitude para consigo mesma, fazendo com que projeções desvalorizadas simplesmente ricocheteiem. Isso ela consegue ao resgatar o seu corpo. (...) Essa dinâmica de amor próprio e da aceitação de si mesma são o que dá início a mudanças de atitudes na cultura”.


Juliana Wesendonk Soeiro

CRP: 07/26220

Contato 51. 989264043

Comments


bottom of page