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O que as frutas têm a nos ensinar

Nunca fui uma exímia descascadora de laranjas, na verdade sempre assassinava a pobre da fruta, por isso sempre optava por não comê-la, e sim fazer um suco, por preguiça de aprender, admito. Outra fruta que não como, mas aí é por não gostar é a banana. Acho que sou o único ser dessa terra que não curte banana. Nem esmagada com achocolatado, nem na cuca da nona, não desce.

Segundo dia de caminho, joelho se mostrando forte, vou devagar para não forçar, está chovendo, faz muito frio e ainda tem muita neve pelo caminho. Os peregrinos já estão prontos e começam a caminhar, fui até o bar do hostel para tomar meu café da manhã, preciso de energia, porém as sugestões eram precárias, Um café preto, um pedaço de bolo e uma laranja, pronta para ser descascada, não tinha jeito, eu teria que descascá-la, afinal 24km me esperavam. Olhei como todos cortavam e imitei. Um dedo cortado, mas consegui. Venci a laranja. Saio tarde para caminhar, já não tem mais peregrino atrás de mim e também não vejo nenhum na minha frente. Preciso parar e comprar algo para comer pelo caminho, pois vou ficar com fome. O que eu não sabia, ainda pela imaturidade da caminhada é que essa etapa seria minha primeira maseta, mais de 10km sem nada, sem tiendas, banheiros, casas, pessoas. E sozinha fui caminhando na neve, o medo bate, pois não se vê nada, e a fome cresce, pois não se tem ideia de quando vai chegar.

Caminho 11 km na neve, meu medo já era maior que a fome, pois, placas diziam cuidado cão raivoso, eu via os cães, mas fingia que não e seguia. Se eu parasse, congelaria. Tinha que atravessar muitas trilhas que estavam cobertas pela neve, eu realmente não sabia se estava no caminho certo, com a chuva na cabeça, só pensava em achar algum lugar para parar, mas fui seguindo, o choro vem de novo. É inevitável quando não se tem ideia de onde está, para onde está indo e ainda tem uma camada grossa de neve na tua frente que tu não sabe se ao pisar, tu não vai cair em algum buraco. Mais uma vez apelo à Santiago, não sou uma pessoa muito religiosa, mas se eu estava no Caminho do seu Santiago, ele bem que podia me dar umas dicas. Fui caminhando, pedindo para aparecer uma estrada, uma pessoa (por mais assustador que parecesse) sozinha lá, me sentia o Leo di Caprio em O Regresso. Só faltou o urso.

Chego finalmente em uma estradinha e encontro um casal de peregrinos da Suíça, pergunto se posso caminhar com eles porque estava muito assustada e cansada com o trajeto. Sim, claro! Foi a resposta e logo veio o conforto. Mais alguns quilômetros sem nada por perto, e eles falam: – vamos parar para lanchar, nosso corpo precisa de caloria. Eles tinham comprado um dia antes, muitas frutas e chocolates para essa etapa. Procuramos um lugar para nos proteger da chuva e da neve. Não falei que não tinha comida, fiquei apenas tentado me aquecer. Você não tem lanche? Eles comentam assustados. Nós temos de sobra e você precisa se alimentar. Ganho duas bananas. Penso, se eu não comer, vou desmaiar por aqui. Baita vexame. Por serem suíços, eles tinham um estoque de chocolate, para a nossa alegria, e foram os melhores que já comi. Devorei as nanicas agradecendo por elas estarem me alimentando e me dando forças.  Hoje eu ainda não sei descascar laranja direito e continuo não gostando da banana. Mas às vezes se permitir aprender, sair da zona de conforto, se esforçar, pode dar forças para seguir, seja qual caminho for.

Por Gabi

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