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Essa carta é para você, mulher

Essa carta é para você, mulher. É para vocês, meus amigos. Uma carta, uma história para compartilhar, para iniciar meu processo de cura. Eu preciso compartilhar. Pois, por quase um ano, silenciei. Vivi tudo sozinha. Com vergonha, culpa e apego. Há quatro meses decidi pôr um fim ao relacionamento que estava vivendo. Um fim no que eu acreditava que era a realização dos meus sonhos. Só que eu não tinha percebido que estes mesmos sonhos já haviam desmoronado há mais tempo. Eles tinham acabado desde o primeiro dia que fui pega pelo queixo, de forma agressiva, chacoalhada, em um dia de sol na beira na praia, na frente de outras pessoas. Foi o primeiro sinal de violência. Eu chorei muito nesse dia, já prevendo que algo estava errado. Também não percebi que era o fim quando fui pega pelo pescoço e erguida contra a parede, vendo raiva nos olhos do meu companheiro, que antes eu só via, ou achava que via, amor. Num ciclo de perdão, de amor, de raiva, de tristeza e dor, as coisas só foram piorando. Em socos, pontapés, arranhões. E socos. Muitos socos. Aliás, não esqueço do dia que levei aqueles socos na minha cabeça. O dia do fim realmente aconteceu quando recebi, por minha escolha, o último soco. Um soco na barriga que me derrubou ao chão. Um soco que me jogou ao fundo do poço. Que me levou ao chão desse fundo do poço. E tudo o que eu vinha sentido há quase um ano, transbordou. Transbordou numa coragem. Transbordou em força. Transformou num grito de liberdade. Transformou num pingo de esperança de que eu não merecia mais aquilo. Não mais. Eu finalmente acreditava que ele não me amava. Em prantos, com dor no corpo e no coração, levantei. Num ímpeto, sem olhar para trás, fui para o quarto, peguei minha mochila e as primeiras roupas que eu vi na minha frente. E falava comigo mesmo, num tom de convencimento, que era a hora de deixar tudo para trás e ir embora. Deixar ir sonhos, amor e dor. Voltei e consegui gritar: “só volto para buscar o resto”. Um grito de “chega”. De liberdade. Fui até a porta de saída e abri. Naquele momento eu abri a porta para o mundo. Para o desconhecido, enfrentando o medo do que estaria por vir. Pois, antes, eu só sentia medo. Medo de estar desistindo de algo, que no fundo eu sabia que não tinha mais volta. Nossa história já começou atribulada, dois anos antes. Mas fechei os olhos para isso. Quis viver aquele amor. Quis ver aquele sorriso todos os dias, rir com ele todos os dias, viver coisas diferentes com ele todos os dias. Queria explorar o mundo com ele todos os dias. Mas os dias foram passando, e a desvalorização veio chegando. Eu me sentia culpada por cobrar mais parceria, por divisão de tarefas, por companheirismo, pelo fim das irresponsabilidades, pelas críticas, pelos flertes com diversas mulheres diferentes, ao mesmo tempo que minha autoestima ia caindo cada vez mais. Eu pensava que a culpa era minha. Eu tinha certeza que a culpa era minha. Afinal, ele também reforçava que a culpa era minha. Eu que ficaria sozinha, eu que era insuportável, eu que não estava me cuidando, eu que estava engordando, eu que não estava fazendo nada por mim. Eu que só reclamava. E, realmente, eu não estava fazendo nada. Principalmente me amando. Eu não acreditava que o príncipe, tinha virado o sapo. Aprendi desde pequena que, quando o príncipe chega, somos felizes para sempre. E por isso, acreditava que, ao perdoar meu companheiro, eu estaria com a chance de me salvar, salvá-lo e a nossa relação. Mas a gente somente salva a si mesmo quando quer. Não quis denunciar, como muitas mulheres também não tem coragem de fazer. Afinal, não queremos prejudicar ninguém. Temos vergonha e repito: medo. Não sei de onde veio esse medo, mas eu o mandei pastar. Ele está aqui ainda, mas estou encarando-o, assim como a tristeza, a decepção e a frustração. Estou vivendo. Coisas boas aconteceram. Há vida lá fora. É difícil ir embora. Difícil sair de um ciclo de um relacionamento, mesmo que não é bom para nenhum dos dois. É difícil desistir. Mas não desista do seu bem. De você. Não desejo mal ao meu ex-companheiro. Quero mais é que ele seja feliz. Mas eu não quero que ele esqueça os transtornos psicológicos e de estrutura de vida que causamos aos dois. Para que ele tenha ciência que ele errou. Errou feio com uma mulher, um ser humano, com a companheira que era leal a ele. No mais, estou indo bem, até. Como um mar, sinto as ondas às vezes furiosas, às vezes calmas, às vezes paradas. E minha vontade agora é só de ajudar. Viver. Me dar tudo o que mereço de bom! Viver tudo aquilo que quero viver. Há um mundo incrível lá fora. Quero ajudar quem precisa abrir esta porta. Ajudar quem está se sentindo sozinha e quer criar a coragem para abri-la. Abra a porta da sua vida e deixe o verdadeiro sol entrar.

Caroline Tatsch

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