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Encontros e desencontros na vida conjugal de mulheres e homens

Marlene Neves Strey

As relações entre mulheres e homens variam e se transformam na medida em que os tempos vão passando. Se a gente se debruçar sobre as diferentes épocas históricas, as diferentes regiões do globo, as distintas culturas, em seguida nos damos conta da diversidade existente nesse assunto. Mas uma coisa chama a atenção: em quase todas as épocas, tempos e lugares, os homens, com poucas exceções, ocupavam uma posição superior nesses relacionamentos. Desde muito tempo atrás havia a construção (sempre em desenvolvimento) de uma ideia que as mulheres necessitavam um braço forte para ampará-las devido à sua fragilidade, pouca racionalidade e inteligência, fraqueza de espírito etc., etc. Dessa construção, amparada pelas filosofias, ciências, religiões, surgiu o tão propalado rótulo de “sexo frágil” atribuído às mulheres.

Até aí, tudo bem! E hoje em dia? Afinal de contas, a partir da segunda metade do século vinte, o mundo tem andado com passos gigantescos, transformando tudo, mudando ideias, comportamentos, crenças. Verdade! Eu que nasci na primeira metade do século vinte, tenho podido acompanhar todas essas reviravoltas. Que diferença dos dias da minha infância para os dias da infância dos meus netos e netas. Lembro que minha mãe sentia uma certa vergonha por ser uma mulher separada. Vejo hoje que algumas pessoas ostentam diversos casamentos, separações e divórcios com um certo orgulho por sua liberdade em agir conforme seus desejos: se não está bom, é melhor terminar uma relação do que suportá-la como fonte de infelicidade. Lembro que meu pai ou meu marido poderiam impedir que eu trabalhasse fora quando eu era bem jovem. Que não poderia trabalhar depois de certo horário noturno a não ser que fosse cantora, bailarina ou, certamente, prostituta. Pois bem, isso certamente mudou. Mas e as relações afetivas também mudaram tanto assim?

Posso dizer, a partir de meu trabalho como psicóloga e pesquisadora, que, o que mais vejo é ambiguidade. De muitas mulheres também, mas, principalmente, por parte dos homens que estão conseguindo, pouco a pouco, romper com o modelo oferecido pela sociedade patriarcal, que tenta colocar as mulheres em situação de submissão, mas que apresentam ainda inúmeras contradições. Por exemplo, um homem (muitos homens) ao mesmo tempo em que coloca a mulher (a sua mulher, as mulheres em geral) no mesmo patamar que ele (ou os homens em geral) já que vive no tempo cujas mudanças ele percebe, também espera que essa mulher tenha uma capacidade de compreensão, continência e completa aceitação nos momentos em que as coisas não vão bem. Ou seja, ele ainda espera dela a mesma disposição abnegada que seu pai e seu avô esperavam de suas mulheres. Ele espera apoio mais ou menos incondicional, realização ou pelo menos responsabilidade maior nas tarefas da família, tudo isso de maneira alegre, sedutora, carinhosa, além, é claro, de ser uma mãe afetiva e, se possível, reservando a quase totalidade de seu afeto e energia para a família.

E eu ainda nem comecei a falar sobre a questão do trabalho profissional dessa mulher. Como imaginar uma mulher que trabalha durante o dia inteiro fora de casa que tenha toda essa disposição incólume para ouvir, seduzir, cuidar. A super mulher que enfrenta cem por cento radiosa todos os desafios é uma mulher idealizada, muito diferente de uma de carne e osso.

Apesar de todas as mudanças, ainda persiste a ideia de que a mulher é a responsável pela manutenção emocional da família dado que, também ainda persiste a ideia de que o homem encara o envolvimento como uma espécie de prisão, da qual procura se libertar sempre que puder. Todas e todos nós conhecemos pessoas assim, mas também conhecemos pessoas totalmente opostas e, entre esses dois polos, todo tipo possível de combinações. Tanto homens, quanto mulheres.

O que podemos pensar a partir disso? Primeiramente que, apesar do andamento das transformações, ideias, comportamentos, crenças aparentemente superados, sempre encontram alguma maneira de manterem-se, de não serem realmente superados. Coisas do passado (às vezes muito distante) e do presente coexistem num embate permanente. Isso é fácil compreender quando vemos que muita gente, por exemplo, acha que o jeito de antes era muito melhor, certo,

verdadeiro e satisfatório. Vemos isso inclusive em leis e projetos governamentais que são considerados conquistas em termos de direitos humanos, por exemplo, que são continuamente ameaçados de reversão porque certos grupos não os consideram conquistas benéficas e sim algum tipo de deturpação da “ordem natural”.

Como superar isso? Não vamos! Agora, se queremos uma sociedade mais igualitária, mais justa, esse tipo de discussão tem que ser levado a cabo em todos os lugares, incluindo crianças, jovens, adultos/as, velhos/as. Quanto mais abertos e transparentes esses embates, maior a chance de que o resultado seja o melhor para todas e todos

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