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A pequena grande lista


“ Perguntam se já se formou, se já casou, se já teve filhos, mas ninguém pergunta se você é feliz” ( Crioulo).

Desde que me conheço por gente eu crio listas na minha cabeça. Ainda criança, lembro de estar no último período da escola e pensar que quando chegasse em casa eu faria as minhas tarefas, depois iria almoçar, depois assistir meu programa favorito, lição de casa, banho etc... Percebem o absurdo que é uma criança de 7 ou 8 anos já carregar essa "obrigação" ?

E aí, dia desses, acordei e fiquei deitada na cama, olhando pro teto, fazendo a minha lista mental de afazeres, de metas, ambições, naquele pequeno espaço entre o sono e o acordar. Eu consigo visualizar essa pequena grande lista ali, no teto do meu quarto, me encarando, como se dissesse " Vai levantar daí ou não"?

Será que sou apenas eu ou vocês também compartilham desse hábito? Quais itens fazem parte da sua lista?

E, mais, você já se perguntou se na sua lista constam coisas como:

· Tempo pra si mesma

· Ler um bom livro

· Ouvir música

· Comer e beber algo de que goste ( sem contar calorias)

· Rir com as amigas

· Beijar e abraçar a quem amamos

· Ser grato pelo o que já temos, como nossa saúde, por exemplo?

Ou, assim como eu, você fazia uma lista que incluía basicamente itens como:

· Faculdade

· Carreira

· Dinheiro

· Casa

· Carro

· Filhos

Obviamente, tudo isso faz parte da vida e é importante, porém, porque naturalizamos o fato de que todas essas coisas palpáveis definem quem somos e o nosso conceito de “ felicidade”.  Será mesmo que a felicidade é medida por todas essas coisas? Será que os meus avós, que não fizeram faculdade, tiveram carros, casas e muito dinheiro, não forma felizes? Será que se todos vivêssemos numa situação financeira confortável, com os amados diplomas pendurados na parede, a carreira dos sonhos, os carros, casas e dinheiro, seríamos, de fato, felizes (ou completos)?

Esse tempo em casa, mais calmo, mais leve, me fez refletir sobre coisas que eu sempre julguei como essenciais. Eu não vejo, por exemplo, os meus precoces cabelos brancos como abomináveis. Ao contrário, tenho me achado mega chique com alguns fios aparentes. Não vejo a minha pele sem nada de maquiagem como ' desleixada'. Tenho aprendido a admirá-la em sua versão sem filtro, absorvendo cada traço novo, cada mudança causada pelo tempo, o que me faz ser grata pelo meu tempo aqui.

Com essa pausa, eu comecei a questionar cada item dessa minha infinita pequena grande lista, que sempre fez parte da minha vida, desde um tempo em que eu não deveria estar fazendo listas, mas correndo, brincando e aproveitando a leveza daquela vida. 

É impressionante como esse resgate de mim trouxe à tona coisas que eu nem lembrava, coisas que fazem parte de um passado tão distante que às vezes eu não sabia identificar se realmente tinha acontecido ou se era coisa da minha fértil imaginação. 

Eu lembrei, por exemplo, de uma situação que deve ter acontecido ali pelos meus dez anos, em que num determinado momento do meu dia, no meio de uma aula, fiquei pensando em como seria a minha vida quando fosse adulta. Eu sempre tive uma pressa de viver, o que hoje vejo como medo. Puro e simples medo de não poder controlar tudo.

Pensava que tinha que terminar o ensino fundamental, depois o médio, depois faculdade, mestrado e doutorado. Não sabia ao certo se queria casar ou ter filhos, mas a única coisa que eu pensava era que eu tinha que cumprir aquela lista que eu criei desde bem mais nova. E bem rápido, por sinal. Queria tudo pronto antes dos 30 anos. 

E ai eu buguei, chorei, fiquei cheia de remorso, de pena daquela menina que já tão novinha sentia que a vida era uma interminável lista de tarefas. 

E então, como um soco no estômago, a vida veio e me deu uma chacoalhada, mostrando que ela deve ser vivida, sentida, absorvida em sua essência. A vida é hoje, o agora, o presente. A vida é uma lembrança, um cheiro, uma comida, uma risada, um abraço, um som que te transporta para um bom lugar. 

A vida é ter coragem de vivê-la se medo, sem regras, sem um roteiro. A beleza da vida é justamente a nossa total incapacidade de poder controlar o percurso dela. 

A vida me mostrou que os planos podem mudar, que a ordem das coisas não faz a menor diferença no resultado final. 

Com uma das minhas grandes amigas  eu aprendi que a beleza dessa jornada é justamente aceitar o nosso percurso, vivendo da melhor maneira possível. Vivendo da forma que funciona para o nosso estilo de vida. Com ela, eu aprendi que  a vida é fugaz, rápida e rasteira e que sempre devemos aproveitar ao máximo cada pequeno momento. Seja ele breve como um suspiro.

Ela me ensinou a ter coragem de aceitar os caminhos que a vida nos leva, a entender que todos temos momentos diferentes e que tá tudo bem. Não precisamos viver numa eterna competição que, na verdade, só existe na nossa cabeça. Ela me ensinou que a coragem é algo que nasce com todas nós, por mais pequenas que sejamos.

Ela me ensinou a trocar as lentes, a focar no lado positivo da vida, da beleza dela, nos altos, baixos, tristes e felizes momentos.  

E quanto aquela lista? Eu decidi que vou guardá-la num lugarzinho, como um relicário, mas acho que não preciso mais seguir tão à risca os itens dessa minha longa lista. Entendi que os caminhos que me trouxeram até aqui foram modificados pela vida e os aceitei. 

E quer saber, não foi como eu planejei, mas funcionou!

Adendos:

1º  Rafa, minha irmã, muito obrigado por me mostrar que a vida só é válida se vivida do modo mais vibrante possível. 

2º A nossa estrelinha Cecí, obrigado por nos mostrar que uma vida sem amor e esperança é o mesmo que viver um dia em mil. 

Até a próxima, irmãs.


Por Amanda Alves Rodrigues

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